A iniciação pelas ações motoras

Comecemos por um ponto fulcral que é o foco da relação pedagógica. Na abordagem pelas técnicas o processo está centrado no professor, a fonte do saber, o modelo a imitar e na abordagem pela expressão está centrado no aluno ou nos alunos, que “já sabem dançar”, que têm a liberdade de se expressar, pelo que o papel do professor será meramente decorativo. Existirão algumas práticas intermédias, menos radicalizadas, mas a filosofia das duas abordagens tende a usar quase em exclusivo os dois extremos do espectro dos estilos de ensino, por comando nas técnicas e não diretivo na expressão.

Esquece-se com muita facilidade, o terceiro pilar da relação pedagógica: os conteúdos. Centrando o processo ensino-aprendizagem nos conteúdos, todos os estilos de ensino podem ser utilizados, dependendo obviamente das situações, que podem ir da simples transmissão de uma maneira de fazer (saltar, rodar, etc.) até à exploração de diferentes e novos modos de fazer (composição coreográfica).

A seleção dos conteúdos programáticos para a fase de iniciação à dança deve responder a algumas questões que as outras duas abordagens não conseguiram resolver categoricamente. Comecemos pelas técnicas: existirá um tronco-comum a todas as formas de dança? Se existir, poderemos começar por aí, abreviando, comparando e fundindo, preparando uma especialização que deverá ocorrer mais tarde. O conceito-chave é o de ação motora. Em todas as formas de dança existem passos, deslocamentos, saltos, voltas, equilíbrios, etc. Parece-nos lógico que se comece por aprender primeiro a saltar, no sentido genérico, do que a aprendizagem se centre num salto específico de uma forma de dança. As habilidades técnicas não são mais do que especializações de ações motoras básicas. Dar um passo atrás para, poder mais tarde, dar dois passos em frente.

A aprendizagem das ações motoras básicas da dança, ainda sem a especificação de um estilo, tem também uma vantagem relativamente aos objetivos pretendidos pela abordagem pela expressão. Porque ninguém cria no vazio, é importante lançar as bases, a aquisição do vocabulário motor que permite depois o jogo criativo. Ninguém se expressa em chinês, por exemplo, sem o conhecimento mínimo do vocabulário e dos elementos estruturantes que permitam realizar um discurso. Ao aumentar o repertório motor, explorando as diferentes formas de saltar, de andar, de rodar, etc., o aluno fica com mais alternativas de escolha, com mais possibilidades de combinação, um fundo de maneio a que pode recorrer para se expressar. Com menos recursos, com acesso apenas a alguns estereótipos, fica mais difícil esperar que a criatividade e a imaginação floresçam. Um segundo conceito-chave é o de frase de movimento, enquanto conjunto de ações motoras. É o elemento fundamental que permite a combinação das ações de uma maneira lógica e estruturar a composição coreográfica.

Em síntese, a abordagem pelas ações motoras que em parte vai beber à modern educational dance, de Laban e colaboradores, que atualmente pode ser designada por dança criativa ou dança educativa, reúne uma maioria de vantagens quando se trata de saber qual a melhor abordagem na fase de iniciação à dança. Prepara de modo eficaz a posterior iniciação às técnicas e por outro lado, aumentando o repertório motor em diversidade, vai permitir aumentar o leque de escolhas quando se tratar de utilizar o movimento dançado como forma de expressão de ideias, sentimentos e emoções.

(1) Luís Xarez Rodrigues (1998). Dança na Escola: Proposta Metodológica com base nas Ações Motoras. G. Valeiro et al (ed.). VI Congresso Galego de Educación Física, Vol. II, pp. 375-382. Universidade da Coruña: Servicio de Publicacións.